terça-feira, 12 de março de 2013

Microfísica do Poder – fichamento crítico


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O filósofo Michel Foucault divaga sobre alguns assuntos ligados à história das ciências, sendo algumas delas a história da medicina urbana, dos hospitais, dos manicômios, dos cemitérios, enfim da história do saneamento no meio urbano, tudo isso como interesse da burguesia.
Foucault discorre sobre a malha do poder, que não significa exatamente poder vindo do Estado, mas que parte de cada um de nós seres humanos, esses poderes não estão localizados em nenhum ponto específico da estrutura social. O que existem são práticas ou relações de poder. Ele relata que na ótica do direito que o poder é concebido como violência legalizada. Ele fala também sobre a teoria do controle, onde a população de forma geral é que vigia umas as outras para que as coisas ocorram conforme o esperado. O poder é produtor de individualidade. Todo saber é político e tem sua gênese em relações de poder.
Foucault critica duramente a psiquiatria, pois ela nasceu de uma tentativa de afastar os ditos “doentes mentais” da cidade. Sendo que a própria psiquiatria que “cria” a doença mental. É facil mostrar como se torna obrigatório desfazer-se do louco justamente porque ele é inútil na produção industrial.
Comenta que a figura do intelectual específico se desenvolveu a partir da Segunda Grande Guerra. Na atualidade, vivemos o desaparecimento do “grande escritor”. Os problemas políticos dos intelectuais são em termos de “verdade/poder” e não em termos de “ciência/ideologia”.
A humanidade, conforme Foucault, instala cada uma de suas violências em um sistema de regras, e prossegue assim de dominação em dominação. O domínio das regras é o segredo do grande jogo da história. O europeu não sabe quem é ele: ele ignora as raças que se misturam nele. Fala-se raramente sobre a história da justiça, da prática judiciária, do que foi efetivamente um sistema penal, do que foram os sistemas de repressão. Toda a repressão a vagabundos, ociosos, mendigos desde o fim da Idade Média até o século XVIII era com intuito de aprisionar e leva-los ao trabalho forçado, já com os “violentos” da plebe, os que estavam mais prontos a passar à ação imediata e armada, pessoas que nos dias de motim traziam armas e fogo esses eram presos com o intuito de isola-los para que não servissem de ponta de lança aos movimentos de resistência popular. Hoje essa plebe não proletarizada é usada pela burguesia como soldados, policiais, traficantes, pistoleiros e utilizados na vigilância e na repressão do proletariado. O primeiro erro das associações operárias foi ter excluído a massa dos operários não especializados através da condição imposta que para aderir à associação pertencer a uma profissão. Não é com ideias que se faz avançar a história, mas com uma força material, a do povo que se reunifica nas ruas. Os milhões de vagabundos que existiam na China semi-colonial e semi-feudal, foram a base do primeiro Exército Vermelho. Nossa ideologia moral é a ideologia burguesa que é reafirmado e reconfirmado pelas sentenças dos tribunais.
O intelectual, diz Foucault, era aquele que dizia a verdade àqueles que não a viam e em nome daqueles que não podiam dizê-la. As escolas se parecem um pouco com as prisões, as fábricas se parecem muito com as prisões.
Designar os focos, denunciá-los, falar deles publicamente é uma luta, forçar a rede de informação institucional, nomear, dizer quem fez, o que fez, é um primeiro passo para outras lutas contra o poder.
O corpo é uma realidade bio-política, completa Foucault. A medicina é uma estratégia bio-política.
Na França as estatísticas de nascimento e mortalidade e, na Inglaterra, as grandes contabilidades de população aparecem no século XVII. O nascimento da prisão foi em fins do século XVIII. A constituição das ciências humanas foi no século XIX.
Sobre os cemitérios, Foucault relata a história do “Cemitério dos Inocentes” situado no centro de Paris, onde o amontoamento de cadáveres passou dos limites dos muros e caiam em volta, no quintal de casas vizinhas. Somente em 1780 foi que ocorreram as primeiras emigrações de cemitérios para a periferia da cidade, aí que surge o cemitério individualizado, o caixão individual.
Os matadouros que também estavam situados no centro de Paris foram colocados nos arredores.
Em meados do século XVIII, que o subsolo passou a pertencer ao rei, ao Estado, e não mais ao proprietário do terreno.
A noção de salubridade surgiu pouco antes da Revolução Francesa.
A partir de 1832, Paris passou a dividir bairros de ricos de bairros de pobres.
Reaparece no século XIX, grupos de dissidência religiosa, que tem por objetivo lutar contra a medicalização, reivindicar o direito sobre seu próprio corpo, o direito de viver, de estar doente, de se curar e morrer como quiserem.
Foucault relata que o médico que as comunidades religiosas chamavam para fazer visitas aos hospitais era, geralmente, o pior dos médicos. Percebemos que a característica em comum entre essas instituições (escola, usina, hospital) é uma separação decidida entre aqueles que têm o poder e aqueles que não o têm.
A prisão, diz Foucault, foi um grande instrumento de recrutamento. A pessoa entrava na prisão e se tornava infame e quando saía, não podia fazer nada senão voltar a ser delinquente. Virava um proxeneta, um policial ou um alcaguete. A prisão profissionalizava.
A polícia, aponta Foucault, precisa dos delinquentes para sobreviver, do contrário não aceitaríamos esta gente uniformizada, armada, enquanto nós não temos o direito de o estar, que nos pedem documentos, que vem rondar nossas portas.
"O poder enlouquece, os que governam são cegos. Somente aqueles que estão à distância do poder, que não estão em nada ligados à tirania, fechados em suas estufas, em seus quartos, em suas meditações, podem descobrir a verdade."
A geografia se desenvolveu à sombra do exército. Os geógrafos do século XIX eram agentes de informações, informações que eram diretamente exploráveis pelas autoridades coloniais, os estrategistas, os negociantes ou os industriais.
Foucault continua, dizendo que as lutas políticas, os confrontos a respeito do poder, com o poder e pelo poder, tudo isso deve ser interpretado apenas como continuações da guerra, como episódios, fragmentações, deslocamentos da própria guerra. O poder não para de registrar e institucionalizar a busca da verdade, profissionaliza-a e a recompensa. A produção de discursos “verdadeiros” (e que, além disso, mudam incessantemente) é um dos problemas fundamentais do Ocidente. O poder não se aplica aos indivíduos, passa por eles.
O saber sociológico se constitui sobretudo em práticas como a dos médicos.
"Seu problema não era fazer com que as pessoas fossem punidas, mas que nem pudessem agir mal, de tanto que se sentiriam mergulhadas, imersas em um campo de visibilidade total em que a opinião dos outros, o olhar dos outros, o discurso dos outros os impediria de fazer o mal ou o nocivo."
Foucault ouve um “sussurro anti-sexo” vindo por aí. Para um sistema que se preocupa com produção e consumo, sexo é uma perda de tempo.
Para resistir, Foucault segreda, é preciso que a resistência seja como o poder. Tão inventiva, tão móvel, tão produtiva quanto ele. Que como ele, venha de “baixo” e se distribua estrategicamente.
Houve um momento em que a loucura deixou de aparecer como a máscara da razão, e foi inscrita como um Outro prodigioso mas presente em todo homem razoável, detendo uma parte, talvez o essencial, dos segredos da razão.
Crítica à Maquiavel: ser hábil em conservar seu principado não é de modo algum possuir a arte de governar. Um bom governante deve ter paciência, soberania e diligência. Deve ser mais paciente que colérico. Deve ter o conhecimento das coisas, dos objetivos que deve procurar atingir e da disposição para atingi-los. O governante deve ser como o pai de família, que é o que se levanta antes das outras pessoas da casa, que se deita depois dos outros, que pensa em tudo, que cuida de tudo pois se considera a serviço da casa.
A família como modelo de governo vai desaparecer. A família em seu formato tradicional esta desaparecendo.
Por todas essas idéias que Michel Foucault continua sendo tão geniais e contemporâneas.

segunda-feira, 11 de março de 2013

Sobre os principais impactos da Reforma Protestante para a formação da sociedade moderna


A Reforma  Protestante teve grande influência na formação da sociedade moderna. Comecemos pela economia, que foi influenciada a seguir o caminho burguês, já que que se ganhou a liberdade com relação ao domínio católico de Roma, e com os ideais de predestinação de Calvino, onde os escolhidos de Deus, os que seriam salvos, eram os que possuíam condição social de riqueza, sendo os mais ricos, os abençoados financeiramente aqui nessa vida, os eleitos do Senhor,  havia um incentivo em acumular riquezas,  propriedades, explorar a mão de obra trabalhadora. Mais tarde essa valorização da condição social com base no acúmulo de riquezas, seria incorporado ao sistema capitalista, independente de fé ou religião. O lucro e os juros passam a serem bem vistos e incorporados no dia-a-dia do comércio, sem peso na consciência com relação ao Juízo Final.

Max Weber produz uma tese onde o desenvolvimento econômico dos países ocidentais está aliado à ética do protestantismo. Ele afirma que os países que adotaram o protestantismo, foram os que mais rápido se desenvolveram na lógica capitalista de produção, e que os levaram a serem potências econômicas na atualidade. Ele continua dizendo que já os países que permaneceram católicos não se desenvolveram tanto, localizando-se na periferia do sistema capitalista contemporâneo.  Apesar das posteriores controvérsias, existe sim uma influência do protestantismo no espírito capitalista, visto suas crenças e a influência que elas exercem sobre os fiéis.

O impacto sobra a política se dá na concretização do absolutismo, onde os governos livres da intervenção de Roma, tinham o domínio total sobre seu Estado e podiam cobrar impostos livremente, impostos estes que aumentaram graças ao desenvolvimento do comércio. O Governo da Inglaterra, por exemplo, passa a ter domínio até mesmo sobre a igreja (Igreja Anglicana). Outro fato importante é que os feudos que pertenciam à Igreja Católica na Inglaterra passaram a pertencer ao Estado.

A Contra Reforma, movimento de resposta e ataque ao protestantismo pela Igreja Católica, também trouxe impacto para a formação da sociedade moderna, pois com o objetivo de conquistar novos fiéis, incentivou e investiu nas navegações ultramarinas, trazendo essa influência europeia para o Novo Mundo.

A educação foi influenciada pela Reforma Protestante também, pois incentivava-se a leitura da Bíblia à todas as pessoas, pois a interpretação das Escrituras sagradas era pessoal. Muitas pessoas passaram a serem alfabetizadas a partir de então. Sem contar que a imprensa ganhou muito com a publicação de artigos religiosos e com a publicação da Bíblia, o livro mais vendido por séculos.

Augusto Coelho Neto

A maximização do individualismo


Um contraponto marcante entre o modelo europeu de sociedade medieval e o novo modelo que surge no pós-renascimento é a maximização do individualismo.

No modelo europeu de sociedade medieval  as pessoas viviam em grupos, os feudos. A população trabalhava em equipe, dividiam a mesma fé. As obras artísticas eram anônimas pois considerava-se toda produção artística como sendo responsabilidade de Deus. Na sociedade feudal existiam as classes hereditárias (nobreza, clero e servos) em que nascia-se nela e morria-se nela, sem possibilidade de mobilidade social. A pessoa necessitava do intermédio da igreja para que pudesse ter a salvação eterna (confissão dos pecados e pagamento de indulgências).

Com o Renascimento a sociedade se individualizou. O indivíduo podia escolher se ficava no meio rural ou se viveria nas cidades, comercializando, produzindo. Podia escolher um ofício, escolher sua religião. A salvação passa a ser pessoal, independente de igreja ou outra instituição, a relação espiritual passa a ser da pessoa diretamente com Deus. Agora podia-se assinar sua produção artística e realiza-la com maior independência e liberdade (hoje temos os direitos autorais, as patentes). A qualidade de vida não mais era responsabilidade de sua classe hereditária. Passava a ser atributo do homem todos os frutos do sucesso ou fracasso de sua obra. Podemos constatar na atualidade inúmeros processos jurídicos envolvendo engenheiros, médicos entre outros profissionais por obras ou serviços mal realizados.

A burguesia alimentou e alimenta em muito o individualismo dentro do sistema capitalista. Para a alta burguesia dentro do capitalismo industrial e financeiro, o individualismo que lhes interessa é o individualismo que aliena, que enfraquece a classe mais explorada, o proletariado.  Nasceu o trabalho especializado e específico, que não poupou nem a produção intelectual. O artesão que conhecia todo o processo de produção de seu artefato, se tornou pouco a pouco um trabalhador alienado, que só sabia fazer uma parte do processo de produção. Com  grande parte da população individualizada e alienada, podia-se fazer com que ela trabalhasse mais (tendo menos tempo para se informar, para congregar-se), produzisse mais, por menores salários, e sem voz (Napoleão chegou a proibir a formação de sindicatos e greves com o Código Civil Napoleônico), já que os meios de produção e os bancos agora pertenciam à poucos homens poderosos.

Podemos concluir que o individualismo que se acentuou no pós-renascimento foi benéfico em partes e pode ser perigoso em outras, principalmente quando se alimenta a idéia de “que nessa vida é cada um por sí”. Cabe à sociedade perceber e diagnosticar as dificuldades de se viver em paz e com qualidade de vida.

Augusto Coelho Neto